Um poema da escritora e jornalista Carolina Maingué, autora de Todos os pontos cardeais no corpo, em que a leitura e a escrita de jornais marcam o eu lírico:
outro dia me corrigiram por escrever
país com p maiúsculo
como consta nos manuais
de um certo jornal
eu confesso acho bonito
o gesto de reafirmar
só com uma letra
a soberania da Palavracurioso é que o país a que esse
jornal se refere com formas
garrafais é menos um país
do que um fingimentotalvez outros países
de pomares mais que de jornais
sejam forjados à luz de alguma
nova consciência discretade todos os modos o tempo
das manchetes já não me diz
nada, amoro servidor atualiza a página
várias vezes por dia
não existem maistabloides pra institucionalizar
a notícia pela manhã
e eu não durmohoje nenhum poema amanheceria
as velhas páginas do JB
hoje nenhum poema acabaria
com a ditadura pois a ditadura
é flácida
os poemas
são flácidos
o mau
é flácido
e os heróis
como podem existir heróis?sem dois mais dois
sem cara ou coroa
tente pedir ao pix
ajuda pra decidir alguma coisaesse aqui
é só um poema que sustenta
a dúvida no fim da tarde
no fim da chuva
no começo de setembro