Dois efeitos de manada jornalísticos. O primeiro, encontro no livro A Garota da Banda, da musicista, artista visual e estilista americana Kim Gordon (mais conhecida como baixista do Sonic Youth):
Quando conheci Jutta Koether, ela era editora e redatora na revista Spex. Ela estava me entrevistando e ao Thurston durante a nossa turnê europeia do Daydream Nation, e pareceu confusa pelo fato de que o Sonic Youth, conhecido como uma espécie de banda de punk rock, usaria a ilustração da vela de Gerhard Richter na capa do disco. Para a Alemanha, Gerhard era, e ainda é, seu principal artista contemporâneo, mas para Jutta parecia que estávamos fazendo uma decisão artística banal e orientada pelo status quo. Após semanas dando entrevistas, onde a maioria dos jornalistas fazia as mesmas três ou quatro perguntas, era ótimo ter alguém que nos desafiasse. [p. 277; grifo meu]
Todos questionando as mesmas questões, registrando as mesmas respostas e, plausivelmente, redigindo as mesmas matérias. O trecho faz pensar não só sobre o esquematismo e a falta de criatividade das pautas, mas também sobre o que espera de nós o entrevistado: ser realmente interpelado pelas perguntas, não só enunciar reações decoradas, mas de fato expressar-se.
O segundo efeito de manada está na reportagem “Padre Cícero sem Perdão“, de Adriana Negreiros, publicada na piauí nº117:
Em vez de devolver as ordens à Cícero — e formalmente reabilitá-lo —, o Vaticano sugeria a realização de uma “reconciliação histórica”. Era tudo que Roma podia oferecer. Dom Fernando leu a correspondência, escondeu-a e, após três meses de sofrimento solitário, enviou-a por e-mail para Forti. A psicóloga conta que o sacerdote estava em pânico. “Ele temia que a imprensa caísse matando em cima”, lembrou. Para ela, o mais aconselhável era não titubear. Foi o que disse ao bispo: “Dom Fernando, a imprensa é burra. Os jornalistas repetem a nossa fala. Se o senhor afirmar que o pedido de reabilitação foi negado, dirão isso. Mas, se disser que Roma fez o que sempre quisemos, eles vão na onda“. [p.41; grifo meu]
O famoso problema do jornalismo declaratório: o repórter recolhe aspas e lava as mãos. Pelo que parece, pelo que diz a psicóloga citada, aceitamos tudo, qualquer versão nos calha como verdade.
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